Sempre fui apaixonado por São João. Confesso: uma paixão reprimida durante muitos anos. Desde criança não compreendi muito bem as razões, mas cresci ouvindo que esta não era uma festa evangélica e que deveria manter distância regulamentar daquela fogueira linda que ardia na rua lá de casa. Que vontade de colocar a batata doce ali e deixá-la tostadinha com sabor de brasa. Que som gostoso do forró pé-de-serra com histórias da vida e das gentes. Música com história e com arte. E as comidas de milho, as quadrilhas, os bolos, o arraial e as bandeirinhas? Era tudo tão longe, tão proibido. Distâncias da alegria...
O tempo passou e com a chegada de novos dias descobri que São João permanecia na bagagem. Ele veio comigo nas memórias que não se despedem. Há jeitos de ser criança que ultrapassam preconceitos, discriminações e exclusividades. As religiões dos adultos separam os meninos e as meninas.
Como João foi uma pessoa bonita, cheia de vida e humildade. Preparou os caminhos de Jesus, anunciou boas-novas de salvação, batizou o Filho de Deus, denunciou os religiosos hipócritas de sua época e morreu pelos valores que trazia consigo. De fato, alguém muito especial. Por que não fazer uma festa para ele? Por que não se alegrar pela vida de alguém que nos inspira no caminho do Cristo?
É preciso avançar, quebrar barreiras, reunir famílias, convidar amigos e celebrar a vida. Mais do que isso, é necessário que estejamos dispostos a assimilar exemplos de homens e mulheres que doaram suas vidas, investiram fortemente em suas crenças e depositaram seu futuro em Deus.
Viva São João, que desnudou a religiosidade fria, apática e moralista de seu tempo, mostrando-nos que é possível ser cristão sem ser religioso e ser religioso sem ser cristão.
Viva São João, que compreendeu e aceitou o seu lugar na história, saindo gradativamente de cena para que Jesus manifestasse amor, graça e misericórdia às pessoas.
Viva São João! Que nestes dias nossos relacionamentos estejam firmados em posições de humildade, principalmente quando percebemos que o poder, a arrogância e o dinheiro se apresentam como protagonistas das escolhas que fazemos e do contetamento que possuímos.
Viva São João! Que em tempos de imensa frustração e vergonha com o poder público deste País, sejamos impulsionados na direção da esperança e da renovação para que os caminhos da pobreza e da morte não se perpetuem.
Finalmente, viva São João, pois ele me me faz lembrar todos os dias que o milho é Deus quem dá, que para todos é o munguzá, e que o forró é para a vida alegrar!
Rev. Sérgio Andrade, Deão da Catedral Anglicana da SS Trindade
Publicado no Caderno Cidades-Religião do Jornal do Commércio Recife-PE, em 02.07.2006
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