Quando se vai às ruas e se passa a olhar as pessoas com outros olhos, descobre-se que há em cada uma um certo encanto, um certo mistério e uma certa beleza, até mesmo nas pessoas mais bizarras, porque ali está um filho de Deus que foi criado à sua imagem e semelhança.
Às vezes, da janela de um ônibus, num curto espaço de tempo, o mundo se descortina diante dos nossos olhos.
Hoje eu vi duas pessoas, através da janela de um ônibus que me chamaram a atenção: uma, vestida com roupas de dançarina (penso que seria um transformista) dançando em frente de uma loja, e a cena mais engraçada, foi quando uma jovem começou a dançar a mesma coreografia com ele(a); outra foi uma mulher que estava atravessando a rua, sem blusa, com os seios de fora, na maior tranqüilidade, como se fosse a coisa mais natural do mundo, poderia não ser para os demais, mas para ela, na sua naturalidade, era. Duas cenas diferentes, mas bastante significativas.
De volta para casa, no ônibus, sentei-me ao lado de uma pessoa que logo foi puxando conversa e perguntava meu nome. O seu era Jacó, então eu brincando com ele, dizia-lhe que ele era filho de Isaac e neto de Abraão. Ele estava com uma lata de cerveja na mão e exalava um certo cheiro de bebida, mas estava aparentemente sóbrio, apenas se queixava de que estava cansado, pois trabalhava no porto como estivador. Então eu comecei a falar da importância do trabalho, e o que ele desempenhava, tinha também a sua importância, porque não existe trabalho mais, ou menos importante. Ele me dizia que era analfabeto, quando falei que era aluna da Católica, mas eu dizia para ele que todos nós temos muito que aprender uns com os outros e que ninguém era tão ignorante que não tivesse algo para ensinar; e nem tão culto que não tivesse algo para aprender, e que, cada um era um dom para o outro. Nossa conversa foi bem proveitosa. Ele desceu antes de mim, e ao se despedir, me deu um até logo, na esperança de que nos veríamos em breve. Fiquei feliz em conversar com o sr Jacó e ele também ficou, ao conversar comigo. Com esta certeza eu vou ficar: a de que, naquele momento, eu fui um dom para o sr Jacó, e ele também, foi um dom para mim.
"Cristão é meu nome e Católico é meu sobrenome. Um me designa, enquanto o
outro me especifica.Um me distingue, o outro me designa. É por este sobrenome
que nosso povo é distinguido dos que são chamados heréticos."
(São Paciano de Barcelona, Carta a Sympronian, 375 D.C.)