No Brasil, especialistas ligados ao mercado de trabalho e à economia doméstica dizem que não há pesquisas sobre o assunto. Já no Reino Unido, o assunto é tratado como um problema oficial e o estudo Young Women and financial abuse constatou o alarmante número (89% das entrevistadas) de mulheres que já foram lesadas pelos parceiros. Os dados foram divulgados, na Rádio CBN, pela comentarista Mara Luquet, e mostraram que 75% delas permitiam que o companheiro tivesse acesso às suas contas bancárias, 18% que eles fizessem dívidas em seus nomes e 40% disseram que eles usavam a maior parte de seus salários. Veja a pesquisa em
YWCA.A coordenadora do curso de Economia Doméstica da Universidade Federal Rural de Pernambuco, Fátima Massena, diz que a maior parte dos problemas locais de violência financeira acontece quando a mulher tem conta corrente conjunta com o marido. Nesses casos, ele administra o orçamento depositado no banco. Seja esse dinheiro recebido só por ele, só por ela ou pelos dois. "Já vi casos de mulheres que precisam pedir dinheiro para comprar uma roupa ou ir ao cabeleireiro. Isso para mim é um dos piores tipos de violência financeira", explica. Segundo ela, tem mulher que nem sabe quanto ganha. É só o dinheiro entrar na conta que ele é retirado pelo parceiro. "Tinha uma amiga minha que era professora e no dia do pagamento, o marido ia com ela ao banco. Ele pagava o dinheiro e ela nem tinha o direito de contar quanto ganhava. As colegas ficavam revoltadas", informa.
Segundo a especialista em mercado de trabalho Tânia Nobre, para a mulher que trabalha fora ter conta conjunta com o marido é um perigo. "O companheiro muita vezes é quem administra o salário dela. Isso acontece até quando a mulher ganha pouco".
Outro tipo de abuso financeiro acontece quando o marido quer que a mulher faça milagres com a renda da família e até cobra notas fiscais de todos os gastos da casa. Mas o pior tipo de abuso financeiro é o roubo, que pode ocorrer com dívidas feitas em nome da esposa, falsificação de assinaturas e até furto de bens. A atriz
Suzana Vieira é uma das vítimas mais famosas no País. Segundo ela, o ex-marido levou o conteúdo de seu cofre, com euros, dólares, jóias. Para a vendedora Maria (nome fictício), a perda foi menor em volume, mas a humilhação não pode ser precificada. Seu ex-marido roubou até o videocassete de casa. Mas o pior golpe foi o do falso depósito. Ela dava cheques para o marido depositar, ele colocava o envelope vazio no caixa eletrônico e ficava com o dinheiro.
Em um dia de folga, desconfiada por não receber o extrato de movimentação da sua conta do Itaú, ela foi ao banco e quase desmaiou com a dívida de cerca de R$ 6 mil. "Chorei bastante. Quando cheguei em casa, coloquei as malas dele na porta do quarto, mas ele só saiu depois de três meses". Detalhe: eles moravam na casa dos pais de Maria. Saldo do casamento de 10 anos para ela: uma filha de 14 anos, lembranças da maior humilhação de sua vida e uma dívida que hoje soma R$ 9 mil.
Muito do que acontece atualmente, não é diferente de antes. Imagino que alguém conheça pelo menos uma situação semelhante. É fato que esse tipo de violência não só atingem mulheres de camadas sociais mais baixas, não. Conheço pessoas que se enquadram em duas situações distintas: uma, empregada doméstica, tem seu cartão de crédito na mão do companheiro que faz dívidas para ela pagar; outra, uma funcionária pública federal, com um bom salário, não tem direito nem sequer de ir à manicure sem ter que pedir o seu dinheiro ao marido.Não bastasse a violência física e moral por qual as mulheres passam, sofrer de violência financeira também, já é demais! Não nos cabe aqui no momento julgar as responsabilidades delas por permitirem tais abusos. O fato é que eles existem e devem ser combatidos.
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