A irmã Dorothy Stang não acreditava nas ameaças de morte que recebia.
“Não é sério, eles não teriam nem coragem”, dizia ela.
Três anos depois da execução da freira americana por pistoleiros, no Pará, outros religiosos estão marcados para morrer, no mesmo estado. Preocupada, a CNBB, Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, pediu mais proteção a três bispos ameaçados.
“As últimas ameaças são de dezembro e janeiro”, denuncia Dom Flávio Giovanale, Bispo de Abaetetuba – Pará.
“É que vigora a lei do mais forte, a lei da morte. É isso que está acontecendo entre nós”, afirma Dom José Luiz Azcona, Bispo de Marajó – Pará.
“Um policial, que inclusive serviu de guarda aqui, durante uma época, ele teria assistido a uma conversa entre dois elementos que falaram em uma parada que iriam realizar em Altamira. E essa parada era a execução do bispo. E o valor do prêmio seria R$ 1 milhão”, declara Dom Erwin Krautler, Bispo de Altamira – Pará.
Fantástico - Agora, bispo, como é que o senhor se sente sabendo que sua vida vale R$ 1 milhão para quem o matar?
“Para mim isso é terrorismo psicológico. Eles querem que eu entre em parafuso”, diz Dom Erwin.
Mas por que a vida de um bispo valeria R$ 1 milhão?
“Eles estão contrariando interesses muito fortes na região. São interesses que coincidem na Amazônia com interesses políticos. Os três correm risco de morrer. Isso é uma coisa muito evidente”, aponta Felício Pontes Junior, procurador da República.
Dom Flávio Giovenale diz que está sendo ameaçado por suas denúncias sobre o tráfico de drogas na região de Abaetetuba.
Dom José Luiz Azcona, da Ilha do Marajó, luta contra a prostituição infantil e o tráfico de mulheres para outros estados e países. E também denuncia o narcotráfico: “Dentro de 10 anos, o narcotráfico vai designar, vai nomear os prefeitos de todo o Marajó”.
Mesmo sabendo que suas vidas estão a prêmio, os dois bispos dispensaram a proteção policial.
“Porque seria uma ofensa ao povo de Abaetetuba, eu me sinto muito amado mesmo pelo povo de Abaetetuba”, afirma conta Dom Giovenale.
“Eu olho para ele e tenho vontade de chorar, sabe? De ver a vida dele ameaçada. Um bispo tão bom”, diz uma senhora.
“Por mais que às vezes, quando eu estou sozinho, às vezes a coisa pega, no sentido de ficar mais preocupado”, conta Dom Giovenale.
Dom Erwin Krautler, Bispo de Altamira, também não gosta da vigilância, mas sabe que não pode abrir mão dela. “Eu estou preso na própria casa. Só livre dentro do quarto e dentro do escritório onde trabalho, mas para fora estou acompanhado por três policiais, onde quer que eu esteja, aonde quer que eu me dirija”.
Fantástico - Quem são seus inimigos?
“É muito difícil dizer. Os inimigos me identificam como aquele que é contra. Por exemplo, contra hidrelétrica, contra a derrubada de queimada, contra exploração e madeireira. A razão que para mim foi quase que a gota, que fez o copo transbordar foi uma quadrilha de abusos sexuais contra menores, meninas, que eu denunciei”, explica.
A denúncia foi investigada, mas até hoje, dois anos depois, ninguém foi condenado.
“Eu realmente não acredito, porque ninguém é louco de fazer isso aí, fazer um tipo de ameaça desta. Eu não acredito. De forma nenhuma, não acredito”, declara Lucio Francisco de Paula Costa, Presidente da Associação dos Madeireiros de Altamira.
As ameaças, claro, são anônimas. Mas reais e assustadoras.
“Muita gente pode pensar que isso é balela, que isso não ia acontecer, que são três pessoas idosas, que jamais alguém poderia pensar em matá-las. Mas eu lembro que a mesma coisa era falada em relação à irmã Dorothy, que era uma mulher de 73 anos, que ninguém ia pensar em matá-la e foi exatamente o que aconteceu”, pondera o procurador da República.
Além da tragédia que aconteceu com sua colega, irmã Dorothy, Dom Erwin tem outra história para lembrá-lo diariamente do perigo que corre. Cada vez que entra na casa dos padres em Altamira, um furo na parede o faz lembrar de outro amigo, o padre Humberto Mattle, fuzilado ali em 1995.
“Entraram os elementos, entraram, perguntaram alguma coisa. De repente, executaram. Sentado em uma cadeira aqui e de repente foi crivado”, explica Dom Erwin.
O assassino não foi punido por esse crime. Morreu anos depois ao fazer um assalto.
“Eu vivo pela Amazônia. E, se for necessário, eu morro pela Amazônia, por esse povo que vive aqui”, declara Dom Erwin.
Fonte: Fantástico
Marcadores: Igreja, testemunho
"Cristão é meu nome e Católico é meu sobrenome. Um me designa, enquanto o
outro me especifica.Um me distingue, o outro me designa. É por este sobrenome
que nosso povo é distinguido dos que são chamados heréticos."
(São Paciano de Barcelona, Carta a Sympronian, 375 D.C.)